
Portugal deve acumular Bitcoin antes dos seus aliados e adversários
Artigo escrito em colaboração com Henrique Corrêa da Silva
A projecção de energia e potência sempre foi essencial para garantir segurança, mas ao longo da História implicou destruição ou morte. Hoje, pela primeira vez, podemos transpor essa projecção para o ciberespaço, evitando o recurso à violência. O sistema de Proof-of-Work da Bitcoin transforma eletricidade, a mais universal forma de energia, em propriedade digital incorruptível, o que permite impor um custo físico real aos adversários no domínio digital.
A Bitcoin, uma rede monetária que começou como um sistema digital de pagamentos peer-to-peer, tornou-se em algo bastante mais profundo: um novo domínio de guerra, um computador à escala planetária e uma fundação segura para uma infraestrutura que oferece soberania digital.
Os países que não compreendem esta mudança estão a caminhar às cegas para uma nova realidade geopolítica sem se aperceberem. A frente de guerra do século XXI já não se limita a terra, mar, ar ou espaço, mas abrange também o ciberespaço; e a Bitcoin é o seu terreno de batalha.
Deste modo, os primeiros países a criarem uma posição estratégica e a acumular maior quantidade deste território digital escasso irão herdar um poder assimétrico e uma vantagem estratégica duradoura. Os hesitantes irão tornar-se dependentes daqueles que controlam comércio e propriedade no domínio digital, e Portugal não pode ficar para trás.
Força, território e o novo domínio de guerra
Ao longo de milhares de anos, os países lutaram pelo controlo sobre recursos físicos escassos: terras, minerais e energia. Cada domínio de guerra, quer seja, terrestre, marítimo, aéreo ou espacial, ampliou o alcance humano e redefiniu a soberania de cada nação. As primeiras nações a tornarem-se proficientes em cada um destes domínios tornaram-se potências mundiais. Foi assim que Portugal criou o primeiro império marítimo verdadeiramente global há cinco séculos.
Atualmente, entramos num novo domínio de guerra: o ciberespaço. Ao contrário dos domínios físicos, este é constituído apenas por informação. Ainda assim, nas últimas décadas a informação tornou-se no recurso mais valioso da humanidade e base do sistema financeiro global, da comunicação e da própria governação. O desafio é que a informação não possui escassez natural ou restrição física e, por isso, pode ser copiada, censurada e falsificada sem qualquer custo, dado que bits de informação são fáceis de produzir. De facto, a ausência de um custo físico associado a ações e movimentos no ciberespaço, tornou-o no domínio mais disputado, explorável e fácil de abusar no planeta.
A Bitcoin altera as regras do jogo. Ao incorporar energia na informação digital, a Bitcoin restaura escassez física e consequências reais no ciberespaço. Cada bloco de informação adicionado à blockchain representa prova de que energia foi utilizada computacionalmente e trabalho foi realizado, o que representa um sinal real imutável e impossível de falsificar de que foi aplicado um esforço real para alterar o registo universal da Bitcoin.
Através de Proof-of-work (prova de trabalho), qualquer nação pode projetar potência física no ciberespaço, da mesma forma que o fazem com exércitos, marinhas ou forças aéreas, mas desta vez sem violência cinética.
As implicações deste novo paradigma são enormes: o ciberespaço agora tem um terreno, que pode ser ocupado, defendido e, mais importante ainda, possuído. Assim, Portugal deve deter parte deste terreno de batalha de forma a posicionar-se estrategicamente para um futuro ainda mais digitalizado.
A Bitcoin como território estratégico
Aquilo que o ouro foi ao longo de milénios no tempo dos grandes impérios, é hoje a Bitcoin no tempo das redes digitais: uma forma de propriedade que é escassa, verificável e incorruptível, baseada nas leis da física e matemática e não na política. Mas a Bitcoin é mais do que ouro digital. Bitcoin é um território digital que se expande através da aplicação de energia e potência física.
Quanto mais energia for aplicada e absorvida pela rede, mais valiosa a rede como um todo se torna. Cada Bitcoin representa uma fatia finita deste território global baseado em energia. Possuir Bitcoin é equivalente a ser dono de uma parcela desta rede planetária que não pode ser censurada, invadida ou confiscada sem um custo físico imenso.
Isso torna a Bitcoin não só um ativo monetário, mas também um recurso estratégico comparável a poços de petróleo ou fábricas de semicondutores. A oferta absolutamente fixa e limitada de 21 milhões de Bitcoins faz com que as primeiras nações a juntarem-se à rede e adotarem Bitcoin capturem uma fração permanente de toda a energia que algum dia este sistema terá. E à medida que mais países, empresas e indivíduos se juntam, a quantidade de energia que defende a rede aumenta, o que faz aumentar também o valor de cada bitcoin.
Em termos geopolíticos, isso cria uma vantagem de pioneiro, semelhante à conquista de território durante a colonização de um continente. Uma vez tomada, aquela porção não pode ser diluída ou inflacionada. Por isso, quanto mais tarde um país agir para criar uma posição, mais pequena será a sua porção de soberania no domínio digital.
Deste modo, Portugal deve recuperar o seu espírito pioneiro dos descobrimentos e começar a minerar e adquirir de forma estratégica este ativo que, sem dúvida, irá redefinir a geopolítica global. Quanto mais cedo o fizer, mais influência Portugal será capaz de projetar através do ciberespaço e maior será a sua riqueza enquanto país.
A natureza da potência física no ciberespaço
A principal inovação por detrás da Bitcoin não é uma moeda digital ou a blockchain. A verdadeira inovação é a conversão de energia real, medida em watts, em provas digitais de potência (recibos), que podem ser armazenados e transmitidos, sem intermediários e sem poderem ser censurados. Este processo torna a rede elétrica global na motherboard de um computador planetário, através do qual a humanidade pode competir pelo controlo de forma igualitária e sem necessitar de confiar em terceiros.
Cada proof-of-work presente em cada bloco é energia aplicada em busca de consenso. Quanto mais energia um país contribuir através do processo de mineração, maior é a sua influência em garantir a segurança e a integridade da rede. Ainda assim esta influência não pode ser abusada ou transformada numa arma contra outros. Na verdade, essa influência é constantemente disputada por outros através de uma competição aberta e voluntária.
De facto, através do mecanismo de proof-of-work, os países podem participar, de uma forma não letal, numa competição de projeção de potência no ciberespaço, onde eletricidade substituí a pólvora e computação substituí a artilharia. O resultado é um equilíbrio de poder baseado nas leis da física e não na ideologia, onde se cria uma arquitetura global de dissuasão imune à censura e à corrupção.
Assim, deter Bitcoin é possuir uma parte desta rede e minerar Bitcoin é participar na sua defesa. Juntas, essas ações formam uma aliança pacífica com base em energia onde todos os participantes se fortalecem uns aos outros através da competição.
A nova corrida ao armamento
Todas as grandes inovações militares moldaram a ordem mundial. O mesmo é verdade para o mecanismo de Proof-of-work da Bitcoin, que introduz uma nova forma de projeção de poder: guerra eletro-cibernética, onde máquinas inteligentes competem pelo controlo sobre recursos digitais escassos que usam eletricidade como munição. Esta não é uma ideia recente. De facto, no início do século XX, Nikola Tesla, teorizou, exatamente, acerca desta realidade.
Ao contrário das armas nucleares, esta competição não causa destruição. O resultado desta “guerra leve” não é a ruína de países, mas redes elétricas mais capazes, energia renovável mais barata e defesas cibernéticas mais robustas. Neste contexto, a mineração de Bitcoin não é um prejuízo nem causa danos ambientais, dado que uma porção substancial e crescente da mineração é feita com base na energia renovável e energia desperdiçada (stranded energy).
Cada watt aplicado para realizar proof-of-work fortalece a posição dos países na hierarquia global de soberania digital. Nações que controlam mais energia e capacidade de computação reservam para si uma fatia maior deste computador planetário emergente, enquanto que aqueles que não participarem dependerão de outros para garantir a integridade da sua propriedade digital.
Infelizmente, os críticos do consumo energético da rede Bitcoin falham em compreender o propósito de energia como ferramenta. Energia não serve apenas para conforto. De facto, é o meio através do qual a humanidade preserva ordem contra o caos e a entropia. Se a rede Bitcoin e a competição energética que dela emerge forem capazes de prevenir e impedir guerras, corrupção e tirania digital ou física, ao consumir uma pequena fração da eletricidade global, essa energia não é gasta em vão. De facto, é o melhor uso possível para energia. Cada watt gasto a assegurar e preservar a verdade é um watt não gasto a destruir vidas.
As primeiras nações a perceberem isso irão discretamente transformar o seu excedente energético numa arma para alcançar soberania no ciberespaço. Aqueles que conseguirem da forma mais eficiente e barata projetar watts no ciberespaço irão dominar a nova ordem geopolítica.
Com o seu parque de renováveis Portugal encontra-se bem posicionado para tirar partido desta oportunidade. De facto, o país pode usufruir do excedente energético que produz diariamente para minerar Bitcoin e ativamente acumular o mais escasso ativo monetário que alguma vez existiu.
Bitcoin como infraestrutura de defesa global
A Bitcoin funciona como um sistema de defesa distribuído, dado que os mineradores estão dispersos por todos os continentes, estão conectados através de caminhos na Internet redundantes e são alimentados através de fontes de energia diversas. Nenhuma autoridade central pode desligar a rede e para a destruir seria necessário destruir tanto a Internet como a rede elétrica global.
Ao adotar Bitcoin, os países juntam-se a uma milícia eletro-cibernética que defende um registo de informação íntegro e incorruptível. Participação garante acesso a uma infraestrutura de segurança que nenhuma nação sozinha consegue destruir. De facto, é um sistema de defesa coletivo onde a contribuição de cada participante torna todos mais fortes.
Esta infraestrutura oferece uma solução única que protege contra uma das maiores vulnerabilidades do século XXI: a transformação de sistemas de pagamentos mundiais em armas que são utilizadas para sancionar outros países. De facto, a exclusão de países de sistemas de pagamento como o SWIFT demonstra como o controlo sobre canais de pagamento e informação se pode traduzir em dominância geopolítica.
A Bitcoin neutraliza esta ameaça e permite a qualquer país transmitir, receber e custodiar informação financeira sem ser necessário supervisão ou pedir permissão a terceiros. Isso garante liberdade de ação no ciberespaço, algo comparável a proteger rotas terrestres, marítimas ou aéreas.
Deste modo, uma nação que não participe na rede Bitcoin fica exposta a coerção financeira e a ataques cibernéticos de negação de serviço. Por outro lado, participar é garantir um lugar na nova mesa de poder digital, e Portugal deve lá estar desde a primeira hora.
A vantagem de chegar primeiro
O design da Bitcoin incorpora uma profunda assimetria. A sua oferta é limitada (21 milhões de unidades), mas a capacidade da rede e a sua segurança podem expandir infinitamente. Isso cria um paradoxo semelhante à Trompa de Gabriel: um volume finito com uma área de superfície infinita; o que significa que o número total de bitcoins nunca irá ultrapassar 21 milhões, mas a quantidade de energia que cada uma representa pode aumentar infinitamente e crescer sem qualquer limite.

Isto representa uma consequência estratégica crítica. Ou seja, os primeiros países a adotar Bitcoin irão herdar os benefícios de toda a energia que posteriormente for alocada ao sistema. À medida que mais capital humano for alocado à rede Bitcoin, mais forte ela se torna e mais cresce o valor de cada unidade.
Por outras palavras, o detentor de uma única bitcoin (ou fração de uma unidade) ganha uma reivindicação crescente sobre toda a base energética do mundo, enquanto que aqueles que chegarem tarde devem despender de uma crescente quantidade de energia para adquirir uma pequena fração. Isso significa que quando a maioria da infraestrutura energética estiver integrada com a rede Bitcoin, o custo de entrada para adquirir uma posição será extremamente elevado.
Para Portugal, isso significa que a janela de oportunidade torna-se mais pequena. Cada ano de inação aumenta o custo de entrada e reduz a proporção de território digital disponível para reivindicar. As primeiras nações a acumular Bitcoin irão adquirir a camada base de segurança a partir da qual as futuras economias digitais serão construídas.
Proof-of-Work vs Proof-of-Stake: Potência real vs potência imaginária
Grande parte da elite política ainda assume, erradamente, que “criptomoedas” são todas iguais. Não são. De facto, sistemas de Proof-of-work e Proof-of-Stake são completamente opostos tanto física como politicamente.
Proof-of-Work, o mecanismo de consenso usado pela Bitcoin, mantém a informação segura através do gasto energético; um processo que é objetivo, igualitário e está restringido pelas leis da termodinâmica. Desta forma, é resistente à corrupção.
Por outro lado, Proof-of-Stake usado por redes como a Ethereum, mantêm a informação segura através de confiança com permissões e privilégio abstrato. Apenas recria as mesmas estruturas de controlo que Proof-of-work foi desenhado para substituir. Stake é uma construção imaginária e não tem um custo físico, o que significa que pode ser secretamente consolidado, censurado ou revertido. Apenas é “descentralizado” em nome.
Países, como Portugal, que querem manter a sua soberania devem entender esta distinção fundamental. Proof-of-Work é prova de potência real. Proof-of-Stake é prova de privilégio. A primeira garante a segurança da propriedade através das leis da física, enquanto que a segunda fá-lo por meios políticos e hierárquicos. Escolher o sistema errado é equivalente a subcontratar a segurança nacional a uma elite sem responsabilidades.
Dissuasão estratégica e Preservação Mútua
Na Era Nuclear, a dissuasão foi alcançada através da ameaça de destruição mútua. Na Era digital, a dissuasão pode ser alcançada através de preservação mútua. Quando países mineram e possuem Bitcoin, estão ativamente a contribuir para a segurança da rede. Quanto mais cada nação investe, mais segura a rede se torna para todos.
Adversários que competem por hash power fortalecem-se uns aos outros, porque cada novo participante, efetivamente, faz aumentar o custo de ataque para todos os outros. Esta é a primeira forma de cooperação baseada em confiança zero na história da humanidade: rivais que trabalham em conjunto, competindo uns contra os outros.
Sem dúvida, esta dinâmica transforma o conflito geopolítico. Em vez de escalada de guerra cinética que conduz à destruição, a competição pelo controle de território digital produz estabilidade. De facto, as nações projetam potência não para se conquistarem umas às outras, mas para serem capazes de manter acesso a uma infraestrutura partilhada que preserva a posse e integridade da propriedade privada no domínio digital.
Assim, emerge um equilíbrio que garante a preservação mútua; um balanço de poder que é mantido através de uma competição contínua e não letal no domínio cibernético.
A Bitcoin como imperativo de segurança nacional
Para Portugal, não adotar e acumular Bitcoin não é uma escolha neutra. Trata-se de negligência estratégica. De facto, os primeiros países a adotar novas tecnologias revolucionárias redefiniram o jogo de poder geopolítico a nível global. Com a Bitcoin não será diferente.
Consideremos as implicações se potências adversárias acumularem vastas reservas de Bitcoin ou dominarem a mineração de Bitcoin a nível mundial. Esses países teriam uma porção desproporcional do único registo digital incorruptível, uma grande proporção da base de comércio mundial e o ativo de reserva supremo da era da informação digital. A sua influência económica iria fazer-se sentir em casa transação, contrato ou informação mantida em segurança pela rede Bitcoin.
Deste modo, nações que estabeleçam uma posição em Bitcoin agora irão capturar soberania perpétua no ciberespaço. Atualmente, acumular Bitcoin é equivalente a acumular porções de terra na nova fronteira digital; terra essa que não pode ser invadida, taxada sem consentimento ou destruída. Tal como na era dos descobrimentos em que Portugal se tornou na maior superpotência a nível mundial, esta é uma oportunidade única na história da civilização humana para redefinir a balança de poder.
Conclusão
Cada época da história tem o seu terreno decisivo. Na antiguidade, era terra fértil. Na era industrial era carvão e aço. Na era nuclear era urânio. Na era da informação é Bitcoin; um ativo escasso, ancorado em energia, e capaz de manter a fundação do ciberespaço em segurança.
Acumular Bitcoin é zelar pela segurança do território num novo domínio de projeção de potência. Ignorar Bitcoin é ceder território a outros de forma ingénua.
A História premia aqueles que reconhecem cedo mudanças de paradigma. A Bitcoin marca a transição da humanidade de guerra cinética para guerra eletro-cibernética e de dissuasão destrutiva para preservação mútua e cooperativa. Portugal tem uma escolha: competir para marcar a sua posição neste novo território digital enquanto permanece acessível ou ficar para trás para sempre.
Nas próximas décadas, a influência geopolítica será também medida em hash power e reservas soberanas de energia e capital digital. Os países que compreenderem isso cedo irão liderar o mundo. Isto porque no século XXI a nação que comandar mais watts comandará também a verdade.